quinta-feira, janeiro 05, 2012

"O paulistano está sedento de espaço público"


Por incrível que pareça, já estamos em janeiro - e a avenida Paulista ainda fica congestionada pela romaria de paulistanos e turistas atrás de Papai Noel e pinheiros iluminados. Foi, talvez, o maior presente que a cidade recebeu no ano passado.


A crítica do Ministério Público Estadual contra a interdição da via pela prefeitura, por "priorizar o pedestre", é das mais desafortunadas dos últimos tempos. Não me lembro de nenhuma defensoria declarar "ilegal" a submissão de todas as políticas públicas dos últimos 70 anos aos carros. As vias de acesso secundárias aos hospitais da região sempre funcionaram em paradas gays e afins.


Podemos lamentar que, enquanto a gratuita Bienal de 2010 vivia com corredores vazios, nossas multidões infantilizadas não se cansem de "Jingle Bell" e decorações cafonas (mas Natal de verdade é sempre kitsch). 
Mas a muvuca natalina rompeu um dos grandes tabus paulistanos. Tirou milhares de pessoas de frente da TV e das telenovelas idiotizantes para caminhar na rua e à noite. O paulistano está sedento de espaço público, de bater perna e de ter programas que não saiam a R$ 100 o ingresso.


Nas Ramblas, na Times Square, na Florida ou na Trafalgar Square isso é normal. Aqui, é uma mudança bem-vinda. Lembro que quando foi sugerida a Virada Cultural, nos moldes da parisiense Nuit Blanche, muita gente na prefeitura apostava que seria "impossível" levar milhares de pessoas ao centrão madrugada adentro. Estava errada.


A conquista do espaço público é pedagógica e deveria ser estimulada. Mas, no próximo Natal, que tal se o metrô ficasse aberto até a 1h e o uso do carro nas imediações fosse desestimulado?


P.S.: Já morei na Paulista. Quem se mudou para a avenida nos últimos 30 anos sabia que havia trânsito, multidões nas calçadas, manifestações - o que a faz a mais viva das vias paulistanas. Felizmente ainda existe um lugar assim nesta encastelada cidade.





"O Natal continua"
Texto de Raul Juste Lores
Folha de S. Paulo, Opinião, 4/1/12, p. 2.

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