A 1ª vez que ouvi falar em "Não Existe Amor em SP" fiquei puto. Como bom "paulistano ortodoxo", juntei todas as minhas armas pra defender a minha terra-natal: Quem seria esse tal de Criolo que falava mal da minha cidade?
Era um post de um colega que gostava bastante de rap/hip hop nacional. Particularmente, acho que os Racionais MCs são uma das melhores bandas paulistanas e uma das que melhor traduzem o dia a dia na cidade - fazem o que o rock deixou de fazer: criticar, questionar...
Não conhecia o Criolo. Ouvi a música e pirei. Melódica, com claras influências de Portishead. E muito bem produzida (mesmo porque os raps nacionais carecem de uma boa produção musical... geralmente têm batidas fracas, samplers idem).
Baixei o álbum "Nó na Orelha" (2011) do Criolo e achei excelente. O disco foi produzido pelo Daniel Ganjaman, renomado produtor paulistano que já trabalhou com Racionais, R.D.P.
Dos melhores discos do ano. Recomendo "com força".
A música "Não existe amor em SP" levantou questões importantes que nunca são discutidas, porque... sei lá, quem mora em Sampa não têm tempo de pensar muito a sua cidade! Trabalhamos (ou procuramos emprego), estudamos, pegamos trânsito, nos alimentamos, vemos futebol pela TV e, quando sobra um tempinho, dormimos...
Sempre tive uma visão mais "confortável" da cidade: moro relativamente perto do meu trabalho, num bairro onde não há chacinas de garotos pobres/pretos. Frequento parques, observo a arquitetura de bairros legais, saio pra onde quero (na medida do po$$ível). Tenho acesso a restaurantes, bares, shows.
Mas, há uma parcela grande da população de São Paulo que não está satisfeita aqui: a correria pra chegar no trabalho, a exclusão social, a falta de serviços fundamentais como Saúde e Educação, a enorme gama de oportunidades para poucos, a sensação de solidão em meio à multidão. A falta de relevância nas decisões importantes da prefeitura...
Fica difícil ver amor numa cidade assim, quando se há tanto a se preocupar.
Decretando que "não existe amor em SP", Criolo acabou chamando a atenção das pessoas para a sua relação com a cidade. São Paulo não tem que ser uma cidade que você "só usa para trabalhar"...
É possível se sentir acolhido (amado?) pelos poderes públicos? Há a possibilidade de me deslocar sem que isso seja um sacrifício? Posso caminhar à noite no meu bairro sem ser abordado por policiais? Posso ME DIVERTIR nesta cidade e não usá-la apenas de uma maneira "profissional"?
"Os grafites gritam...", diz a música. Já levantei essa bola num de meus primeiros posts...
A falta de cor, de paisagens naturais... E a falta de interesse dos "homens de cinza" em criar "coisas belas" e acessíveis aos habitantes da cidade. Não temos praia? Foda-se. Criemos coisas mais bonitas que a praia, porra!
EXISTE Amor em SP!
Nas eleições municipais de 2012 desenhou-se um cenário de filme de terror: José Serra e Celso Russomanno iriam para o 2º turno. A população teria que escolher entre a continuidade de administrações conservadoras voltadas a proibições e à segregação das classes mais pobres e um candidato picareta, ex-apresentador de programas apelativos na TV etc.
Surgiu então, um movimento - aparentemente apartidário - chamado "Amor Sim, Russomanno Não" que pregava a exclusão do candidato Russomanno (por vias democráticas, vale ressaltar) do 2º turno das eleições.
Em 5 de outubro de 2012, armou-se uma grande festa na recém-RE-inaugurada Praça Roosevelt, onde as pessoas vestiram a cor rosa e protestaram contra a aberração de um 2º turno Serra X Russomano. (me pareceu que não havia muitos PSDBistas lá...).
Pra mim, a festa foi um sucesso: jovens, velhos, crianças, cachorros, bêbados e, sobretudo, a "classe média" que voltou a frequentar o centro! Povoaram a nova Roosevelt fazendo política, música, teatro e, sobretudo, interagindo com a cidade num clima alegre e de paz!
Na rua, na praça... tudo na maior harmonia.
(sim, meu celular tira fotos horríveis).
Não me pergunte o que era esse falo
cor-de-rosa... não decifrei.
Showzinho de rock no meio da calçada!
E, Russomanno não foi para o 2º turno.
Antes do embate final pela prefeitura de São Paulo entre Fernando Haddad e José Serra, houve, na mesma praça, outra manifestação. Intitulada "Existe Amor em SP" (diálogo saudável com a música do rapper Criolo) a manifestação-festival, "agitada" pelas redes sociais, contou com um show-protesto (grátis) com artistas como Gabi Amarantos, Karina Buhr, Emicida e o próprio Criolo, fechando a noite.
Clamando por propostas melhores ao futuro da cidade, a manifestação levou milhares de pessoas à Roosevelt, no dia 21 de outubro de 2012. Foi outro sucesso. Pareceu-me mais partidária: anti-Serra, anti-continuísmo.
Mas, mostrou que o paulistano também pode fazer política na rua. E o paulistano carece de convivência urbana, repudia o mal uso dos espaços públicos e quer amar (e ser amado) por sua cidade!
Achei foda.
Tudo isso pra dizer que o novo prefeito de Sampa tomou posse ontem. Fernando Haddad gosta de Beatles e queria ser Paul McCartney. Bom sinal.
Já me iludi muito com política. Hoje, não confio mais em partido nenhum.
Mas, em seu discurso, Haddad disse que "Existe Amor em SP". Será que não é o começo para que as coisas comecem a mudar? Eu vou acreditar de novo. Eu não desisto...
Boa sorte , SAMPA!
Obs: Kassab, suma de nossas vidas. Pra sempre.